Subsecretário-geral de Operações de Paz falou com
exclusividade ao G1. Ele pediu que tropa brasileira retirada do Haiti seja
enviada a outros países.
O atual subsecretário-geral de Operações de Paz da
Organização das Nações Unidas (ONU), Edmond Mulet, disse, em entrevista
exclusiva ao G1, que apesar dos soldados brasileiros serem muito bem treinados,
possuem equipamentos antigos, "que não foram renovados nos últimos 30
anos".
Mulet também criticou o gasto anual de 1,5% do PIB com
defesa, classificando-o como "tão baixo" em comparação com outros
países. Em agosto, o G1 mostrou a situação de sucateamento do Exército e que o
país possui munição para apenas uma hora de guerra.
"Eu acho que as soldados brasileiros são muito bem
treinados e muito bem formados, motivados e extremamente profissionais. O que é
verdade, como eu ouvi, é que o equipamento e o material no Exército brasileiro
não têm sido renovados há pelo menos 30 anos, por razões diferentes,
econômicas, etc., e que agora, eles têm intenção de se adaptar às novas
tecnologias", afirmou.
Mulet falou com o G1 durante a Conferência de Segurança
Internacional do Forte de Copacabana, organizada pela Fundação Konrad Adenauer,
no Rio de Janeiro, na quarta-feira (19).
"Quando se vê que o Brasil gasta apenas 1,5% do PIB em
defesa, em comparação com os outros países, isso é tão baixo", observou o
subsecretário. Nos últimos dez anos, a porcentagem do PIB brasileiro investido
no setor ficou em 1,5%, conforme números do Ministério da Defesa. Em 2011, o
valor investido pelo governo na área foi de R$ 61,787 bilhões.
Mulet conhece muito bem a ação do Exército brasileiro no
terreno depois de liderar por mais de dois anos a Missão das Nações Unidas para
a Estabilização no Haiti (Minustah). Após o terremoto ocorrido em 2010, que
deixou mais de 300 mil mortos no país caribenho, entre eles o representante da
ONU Hedi Annabi, o diplomata foi enviado pelo secretário-geral Ban Ki Moon de
volta ao Haiti, para tentar colocar "ordem na casa".
Questionado se o Brasil precisa ter Forças Armadas bem
equipadas e preparadas para conseguir ser membro permanente do Conselho
Segurança, o diplomata disse entender que "isso é uma decisão interna do
Brasil" e que "é uma discussão mais política do que militar".
"Eles [o governo e as Forças Armadas] têm que saber o
que precisam. Mas eu acho que todo país precisa estar apto a ter um nível bem
efetivo de suas próprias tropas", afirmou.
"Eu acho que é uma aspiração legítima do Brasil estar
adaptado para os novos desafios da defesa global e você precisa de ferramentas
e dos instrumentos necessários para ser mais efetivo do que é hoje",
acrescentou.
Tropas brasileiras em outras missões
Em um encontro reservado com o ministro Celso Amorim na
última segunda-feira (17), no Rio de Janeiro, Mulet disse ter exposto que
gostaria que o Brasil mantivesse até o segundo semestre de 2013 os dois
batalhões que possui no Haiti, que totalizam 1.910 homens. No entanto, já há
acordo fechado com a ONU para a retirada do contingente.
"O Brasil decidiu retirar o segundo batalhão (com 850
soldados), que enviou após o terremoto. E isso ocorre de forma sincronizada com
a decisão da ONU de reduzir as tropas, porque a situação melhorou e as capacidades
da polícia melhoraram", disse.
"Esperamos ter eleições no próximo ano e a discussão
que estava tendo com o Amorim era sobre a necessidade de se manter este
batalhão até depois das eleições, porque a ONU é importante para logística e
segurança do pleito", lembra Mulet. "Mas a retirada deste segundo
batalhão já foi acordada entre o governo brasileiro e a ONU, nós devíamos ter
discutido antes."
Com a redução do efetivo no Haiti, a ONU pretendia, então,
que o Brasil mandasse tropas para outra missão. O G1 apurou que uma das
hipóteses cogitadas seria o apoio com soldados no Líbano, onde a Marinha já
comanda uma força-tarefa marítima a serviço da ONU. Mulet, porém, não
confirmou, afirmando que não se referia a uma missão específica.
"Eu disse para o Amorim que, já que o Brasil vai sair
do Haiti, talvez podia considerar usar este grupo em outra parte do mundo. Não
sugeri nenhum país. Mas a qualidade e o alto nível dos soldados brasileiros é
algo que a ONU gostaria ter mais presente. Nós gostaríamos muito de receber a
participação deles em outra parte do mundo", afirmou.
O subchefe de missões de paz da ONU disse ter ouvido um
"não" de Amorim como resposta. "O ministro disse que isso é algo
que, se a ocasião aparecer, vão avaliar as circunstâncias, mas que, neste
momento, eles não têm intenção de dispor de tropas em outra parte do
mundo", contou Mulet.
O Ministério da Defesa confirmou que, em conversa com
Amorim, Mulet pediu que o Brasil participasse de outras missões de paz,
apontando alguns países de interesse, como Somália e Líbano. Contudo, o
ministro afirmou que o Brasil participa de missões de paz nas quais "possa
fazer a diferença", como ocorreu anteriormente com Timor Leste, Angola e
Haiti. A assessoria de imprensa da Defesa diz que Amorim não conversou com
Mulet sobre o orçamento do ministério e a situação das tropas.
Planos para a Síria
A ONU trabalha com ao menos 22 "cenários
diferentes" em que seria possível empregar uma missão de paz em um futuro
próximo.
Segundo Mulet, um dos cenários aponta para a Síria, onde a
guerra civil entre o governo e rebeldes já deixou mais de 19 mil mortos e
milhares de deslocados e refugiados. O diplomata ponderou, porém, que, nesse
caso, não há cessar-fogo, não há entendimento político e nem paz para se
manter. "Uma missão de paz não é uma ferramenta que pode ser usada em
qualquer ocasião."
"Nós não sabemos o que vai acontecer [na Síria], nem
quando isso vai acontecer ou como vão evoluir as coisas no terreno. Mas temos
que estar preparados para responder quando o Conselho de Segurança pedir uma
operação lá, seja missão de paz, de construção do Estado, de desenvolvimento do
país ou missão política. Nós temos que estar preparados para responder a
qualquer coisa e estamos trabalhando com diferentes planos."
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