Por Daniel
Michaels | The Wall Street Journal, publicado no Valor Econômico de 5 de outubro de 2012
O audacioso projeto de fundir a controladora da Airbus,
European Aeronautic Defence & Space Co. e a gigante britânica dos
equipamentos de defesa BAE Systems PLC está se configurando como muitos outros
projetos pan-euro-peus arrojados: um teste da disposição de cada país de
subordinar seus próprios interesses em prol do continente como um todo.
Desta vez, a disputa é entre criar uma grande potência
industrial mundial ou preservar os empregos de cada país, em meio à pior crise
econômica da Europa em décadas.
Os defensores da proposta dizem que a fusão das duas
empresas, formando o maior grupo aeroespacial e de defesa do mundo, em receita,
criaria um campeão na Europa, mais reforçado para competir contra as americanas
Boeing e Lockheed Martin Corp. Eles também argumentam que integrar as divisões
de defesa e de aviação civil das duas empresas ajudaria a compensar as
oscilações do mercado, elevar a qualidade tecnológica do grupo e preservar
postos de trabalho em toda a Europa.
Uma gigante europeia da defesa também poderia incentivar as
forças armadas da região a cooperar mais e aumentar a eficiência em seus
contratos militares. A Agência Europeia de Defesa, responsável pela política
militar da UE, tem tido sucesso apenas limitado nas tentativas de unificar aquisições
dentro do bloco.
"O benefício de um mercado menos fragmentado é
óbvio", disse recentemente o diretor-presidente da AED, Claude-France
Arnould, sem comentar sobre os méritos da proposta Eads-BAE.
Mas para alcançar esses objetivos é preciso, em primeiro
lugar, que os políticos da Grã-Bretanha, França e Alemanha deem uma
demonstração de confiança. Eles precisam ceder sua autoridade atual a uma
entidade pan-europeia que pode não compartilhar suas prioridades nacionais.
O diretor-presidente da BAE, Ian King, e seu colega na Eads,
Tom Enders, argumentaram que o acordo proposto é benéfico para a Europa.
"Ambas as empresas estão convictas de que é a coisa certa a fazer para
[...] os países envolvidos", disse Enders na segunda-feira.
Mas os políticos ainda não estão convencidos, em especial em
Berlim. Autoridades alemãs dizem que os benefícios da fusão para a base
industrial alemã não são atraentes o suficiente para que o país ceda sua atual
posição de predomínio.
A principal preocupação dos políticos não é a lógica
financeira do negócio, embora alguns também questionem esse aspecto. O grande
problema é a necessidade de haver paridade com a França no grupo combinado.
Hoje, a França detém 15% da Eads, através de um consórcio
que controla a empresa e inclui o grupo francês de mídia Lagardère SCA e a
montadora alemã Daimler AG. Autoridades francesas já disseram que não vão
vender suas ações da Eads, que seriam equivalentes a 9% da nova empresa. A
Alemanha não tem ações da Eads, mas exerce uma influência significativa sobre
as decisões da Daimler quanto à sua participação.
Autoridades alemãs dizem que estão preocupadas porque os
políticos franceses costumam envolver-se em questões administrativas internas
de empresas francesas a fim de promover seus interesses nacionais. Já em Berlim
o medo é que, se a Alemanha não conseguir contrabalançar a influência francesa,
o trabalho da Airbus que agora se realiza na Alemanha pode acabar se
transferindo para outros lugares.
A Eads agora emprega cerca de 48.000 pessoas em cada país,
dos quais mais da metade trabalha na Airbus. Fornecedores locais em ambos os
países empregam outras dezenas de milhares de trabalhadores.
Uma autoridade alemã familiarizada com as negociações disse
que a questão principal para a chanceler Angela Merkel e seu círculo interno é
"de que modo essa fusão afetaria a indústria alemã e, em particular, como
afetaria as empresas alemãs de médio porte", que fornecem muitas peças
importantes para o setor aeroespacial.
A Eads e a BAE tentaram aplacar as preocupações nacionais
propondo dar aos governos britânico, francês e alemão ações especiais da nova
empresa, com direito de veto sobre eventuais ofertas de aquisição e atividades
polêmicas, tais como programas de armas nucleares. Mas os políticos alemães acham
que a proposta não tem garantias suficientes.
O presidente francês François Hollande e o primeiro-ministro
britânico David Cameron não comentaram sobre a proposta, mas pessoas
familiarizadas com as negociações disseram que seus respectivos governos são mais
favoráveis do que o círculo de assessores de Merkel.
Enders disse que ele e King precisam que os governos
indiquem se o negócio parece possível até quarta-feira, prazo fixado pelos
reguladores britânicos do mercado de valores mobiliários para apresentação de
uma proposta formal.
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