quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Governos não se entendem e fusão de BAE e Eads fracassa



Por Da Redação | The Wall Street Journal

As companhias aeroespaciais e de defesa BAE Systems PLC e European Aeronautic Defence & Space Co. desistiram de sua planejada fusão depois que Reino Unido, França e Alemanha não conseguiram chegar a um acordo sobre quanta influência os países deveriam ter na empresa combinada.

A decisão de ontem encerrou vários meses de negociações cada vez mais frenéticas das empresas para criar o maior grupo de defesa do mundo em vendas.

A Eads, dona da fabricante de aviões Airbus, e a BAE puseram a culpa nos políticos pela derrocada do acordo, apontando em particular para a intransigência de Berlim, o que levanta novas questões sobre a capacidade dos governos da Europa de colocar de lado interesses nacionais em projetos conjuntos.

O desfecho também representou um fracasso pessoal para os diretores-presidentes das companhias, Tom Enders, da Eads, e Ian King,da BAE Systems, que lutaram com afinco pelo negócio.

King ficou especialmente sob pressão de alguns de seus acionistas que achavam que a fusão com a Eads ia de encontro aos interesses do grupo britânico.

"Ficou claro que os interesses dos acionistas governamentais não podem ser propriamente conciliados entre si e com os objetivos que a BAE Systems e a Eads estabeleceram para a fusão", afirmaram as companhias num comunicado conjunto.

"Nós não pudemos chegar a um acordo com os dois governos europeus sobre os nossos limites de segurança. É correto dizer que a Alemanha foi o principal ponto de conflito", disse King.

O presidente da França, François Hollande, assumiu uma posição neutra em relação ao colapso da fusão. "Não cabe a nós lamentar ou comemorar", disse Hollande numa entrevista coletiva em Paris. "Eu noto simplesmente que houve discussões entre essas empresas. A França apresentou um certo número de argumentos e condições, nossos colegas alemães colocaram um critério, os britânicos fizeram o mesmo, e as companhias tiraram suas conclusões."

A França e a Espanha são acionistas da Eads, com 15% e 5,5% de participação, respectivamente. A Alemanha não tem participação direta na Eads, mas a montadora alemã Daimler AG tem 15% e já estava vendendo grande parte disso a um banco estatal alemão.

A fusão teria criado uma empresa com uma receita anual combinada de mais de US$ 90 bilhões e um valor de mercado de quase US$ 50 bilhões em 12 de setembro, quando o negócio foi anunciado. Os acionistas da Eads ficariam com 60% e os da BAE com o restante. As empresas pretendiam listar a nova entidade nas bolsas de Londres e Amsterdã.

Embora algum progresso havia sido feito nas conversas entre Reino Unido, França e Alemanha na terça-feira, os governos foram incapazes de chegar a um acordo final sobre as participações de cada país, a composição do conselho e a localização da sede da empresa.

As reações dos investidores e analistas foram conflitantes e a ação da Eads recuperou parte do que perdeu desde que a notícia da fusão foi divulgada, enquanto a ação da BAE caiu. Desde o anúncio dos planos de fusão, o mercado havia demonstrado ceticismo quanto ao negócio derrubando as ações de ambas as empresas.

"Um dia triste para a defesa europeia", escreveu Robert Stallard, analista do RBC Capital Markets, num relatório de análise. "Nós sempre acreditamos que esse negócio era benéfico para o setor de defesa da Europa, que continua relativamente fragmentado e com um orçamento significativamente menor que o dos Estados Unidos."

Um porta-voz da Invesco Perpetual, uma unidade da Invesco Ltd., que é a maior acionista da BAE Systems com uma participação de 13,3%, aplaudiu o fracasso da fusão, depois de a empresa ter declarado na semana passada que o acordo colocaria em risco a capacidade da BAE de obter contratos de defesa nos EUA.

King e Enders disseram que suas companhias têm um futuro promissor como entidades independentes.

A BAE é "forte e robusta financeiramente", disse King.

"A Eads vai continuar no seu caminho de crescimento internacional e nossos acionistas podem continuar esperando crescimento lucrativo, excelente liquidez e execução de programas baseados numa forte carteira de encomendas", disse Enders.

A Eads foi apoiada publicamente pelo presidente francês. "Eu tenho confiança na Eads, que é muito bem-sucedida e gera emprego", disse Hollande.

O governo da Alemanha afirmou que resolver um impasse de longa data sobre a participação alemã na Eads é agora uma prioridade.

"Para o governo federal, é agora prioritário que a Eads continue a se desenvolver positivamente em todas as áreas de negócios", disse num comunicado o porta-voz do governo alemão Steffen Seibert. "Para garantir isso, o governo vai, entre outras coisas, continuar negociações sobre a aquisição de ações em poder da Daimler através do KfW." O KfW é um banco estatal de desenvolvimento que o governo geralmente usa para cuidar das suas participações.

A proposta de fusão, que foi negociada durante três meses, morreu num telefonema de três minutos.

Na terça-feira à noite, depois de dias de intenso debate entre representantes de governos e executivos, a chanceler alemã Angela Merkel ligou para Hollande. Ela lhe disse que a Alemanha acreditava que o negócio tinha mais aspectos negativos do que positivos para seu país, e que ela não o iria apoiar, segundo várias pessoas a par da conversa.

"Nós tivemos a oportunidade de testar uma estratégia bastante audaciosa", disse ao The Wall Street Journal Dick Olver, presidente do conselho da BAE, depois do anúncio do fim das negociações.

A resistência da Alemanha, em particular, surpreendeu muitas pessoas envolvidas porque as companhias acreditavam que tinham um plano que faria da Eads, que é controlada por governos, uma companhia mais convencional. "Eu subestimei completamente a oposição alemã", disse Marwan Lahoud, diretor de estratégia da Eads, ao WSJ.

Pessoas familiarizadas com o raciocínio em Berlim disseram que governantes alemães duvidavam de um dos principais argumentos apresentados a eles em defesa da fusão: o de que o acordo aumentaria as vendas de produtos de defesa da Eads nos Estados Unidos.

A Alemanha também temia acabar marginalizada pela França e pelo Reino Unido, que são maiores nos setores aeroespacial e de defesa. Os três países queriam proteger empregos e unidades industriais. A França queria manter suas ações da Eads, enquanto os britânicos queriam reduzir a influência política.

As empresas agora têm o desafio de reconstruir as relações entre acionistas e governos.

(Colaboraram William Boston, William Horobin, Matthew Curtin, Daniel Michaels, David Gauthier-Villas, Dana Cimilluca, Marcus Walker e Marietta Cauchi)

Sessão WSJ do Valor Econômico, 11 de outubro de 2012

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